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Fotovivência - Empreendimentos autônomos recriam a vida de migrantes no Distrito Federal

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Entre tecidos e sabores: Akou, Hanif e Kinan contam histórias inspiradoras de recomeço no Brasil

Publicação: 07/02/2020


Por Tainá Aragão - Comunicação Cáritas Brasileira

Fotos: Tainá Aragão


As migrações alteram para sempre a vida de muitas pessoas. Conheça três histórias inspiradoras de migrantes que iniciaram projetos e recriaram suas histórias na capital do Brasil, a partir da costura, culinária e venda de frutas e verduras.


 AKOU


Roupas que contam histórias - Cada tecido tem um fim, as formas significam e cada cor carrega sentidos. As roupas africanas contam histórias através das suas fibras de algodão, uma história continuadamente viva, como o tom das vestes que cobrem os corpos negros. Tão viva que não cabem nas fronteiras territoriais estabelecidas – elas navegam, caminham, as histórias permanecem em movimento junto aos corpos que as sustentam. Akou Avognon (31), conta sua história de migração a partir da costura, através das roupas que veste e das que cria com suas próprias mãos. A Estilista faz parte do Igalité, (igualdade, em francês), loja colaborativa de roupas africanas localizada em no Shopping Venâncio 2000, em Brasília- DF.


 

Residente no Brasil desde 2017, Akou retomou seu ofício com uma máquina emprestada de uma colega costureira que conheceu na Candangolândia, cidade administrativa do Distrito Federal. Essa ajuda representou uma reviravolta em sua vida, pois a posicionou novamente no mercado de trabalho.  No Togo, seu país de origem, Akou tinha um ateliê e duas funcionárias fixas, porém foi obrigada a abandonar tudo quando seu esposo passou a ser perseguido e a feira na qual trabalhava foi completamente queimada. “No Togo não tem justiça, somente para os mais ricos. Pelas ameaças que recebíamos, precisamos sair. Meu marido foi primeiro para Gana, país ao lado de Togo, e logo ele veio para o Brasil e somente depois eu migrei pra cá com minhas filhas e grávida do Adriano, meu filho brasileiro,” conta.


A loja colaborativa Igalité recebe apoio social do Shopping Venâncio, o qual cedeu por tempo determinado uma loja para quatro estilistas migrantes de países africanos. Akou fica às terças e quartas-feiras na loja, ela  a divide  com mais três estilistas de Costa do Marfim, Guiné-Bissal e Congo.  Para ela, Igalité é a concretização de um sonho: “Essa loja é tudo pra mim, eu nunca pensei que teria uma loja assim no Brasil, é uma grande oportunidade. Por exemplo, quando eu trabalhava na minha casa, não tinha cliente pra vender, mas agora as pessoas chegam aqui e conhecem o meu trabalho. Agora, também eu participo financeiramente na casa e fico muito feliz”, diz contente sobre a conquista da sua independência financeira.


 Para o futuro, Akou pretende continuar o trabalho colaborativo, que para ela é muito lucrativo e onde também encontra espaço para socializar-se. “Se essa loja não continuar, porque é uma ação social do shopping, pretendemos continuar com a proposta colaborativa, pegaremos outro espaço e faremos o mesmo. Tem dado certa essa mistura entre Togo e Brasil,” revela.



 

HANIF


 Aos 46 anos, o refugiado Hanif Ahmed nunca imaginou que estaria mesclando Bengali com Português para se comunicar. Vindo de Bangladesh há 8 anos, ele comemora o 1º aniversário  do seu sacolão de frutas e verduras na Vila Telebrasília, bairro localizado na zona central da Capital do Brasil, um pequeno vilarejo que destoa dos prédios planejados por Oscar Niemeyer e Lúcio Costa. Para chegar a esse empreendimento, Hanif percorreu sete anos vendendo frutas na rodoviária, ele conta que nessa época era difícil complementar a renda familiar. “A Agência de Fiscalização (Agefis) apreendia minha mercadoria, eu não entendia nada, não sabia falar e explicar o que acontecia, foi um tempo difícil até chegar aqui”.


 “Quando abri minha loja aqui na Vila todo mundo me ajudou, a comunidade aqui é muito boa, as pessoas me conhecem por “indiano” e compram comigo”. Explica Hanif a importância de uma comunidade acolhedora para seu empreendimento prosperar, é através da venda de frutas e verduras que ele garante o sustento de seus três filhos e sua esposa no Brasil.


 Para ele, o Brasil é um país abundante, de solidariedade, mas também de alimento. “Acho que o Brasil é muito rico, diverso e grande, cabe todo mundo, isso aprendi com as frutas, aqui tem fruta de todo tipo e todo tamanho, não tem outro país com tantos sabores. O Brasil também é isso, tem gente de todo tipo e isso é muito bom, é o que mais gosto: diversidade”, comenta. Como muitos migrantes, Hanif não pretende morar em outro país, encontrou no Brasil seu novo lar, está construindo sua vida e conquista diariamente uma beleza: oferecer a diversidade como alimento.


 


KINAN



'Vamos queridos!' Esse é o significado de Yalla Habibi, empreendimento culinário criado pelo refugiado Kinan Salah. Com dois Food Trucks, o sírio agregou o tempero Árabe no paladar dos brasilienses, os trallers que servem comidas rápidas localizam-se em um ponto um fixo na cidade de Águas Claras e o outro é itinerante, percorrendo distintas cidades satélites do Distrito Federal.


 “Sou quase brasileiro, já estou diferente”- brinca o refugiado Kinan, que vive no Brasil desde 2014. Sozinho e sem falar português, ele emigrou da Síria porque não estava disposto a arriscar sua vida para servir ao exército em um contexto de guerra, o qual seu país está condicionado desde 2011. “Lá na Síria é obrigatório servir o exército, inicialmente, era apenas dois anos, mas, por conta da guerra tem pessoas que servem até sete anos e, muitos perdem a vida antes de completar seu primeiro ano no exército. Por isso, eu decidi migrar, se não servisse não conseguiria trabalhar (se refere a não posse do documento de dispensa), e eu queria abrir meu negócio... queria viver”.


Assim que chegou ao Brasil, Kinan foi ajudado por outro Árabe que conheceu no aeroporto. Por um ato de solidariedade desse então desconhecido, conseguiu o primeiro emprego no Brasil, em um posto de gasolina, onde trabalhou dois anos e sete meses. Foi por meio dessa primeira oportunidade laboral que o Sírio conseguiu dar outros rumos para sua vida. “No posto, eu comecei a juntar um pouco de dinheiro e comprei o meu primeiro traller. Estava tudo financiado, tudo parcelado, nada à vista. O primeiro ano, em 2017, foi difícil pra gente, pois a comida Árabe leva muito tempero, mas a gente foi ajustando e agora os nossos clientes brasileiros gostam muito.”, conta.


Para os migrantes que estão chegando no Brasil e querem empreender, Kinan indica: “Acredite e sempre pesquise como pode melhorar, essa é uma receita boa que eu sigo”. Para ele, é importante ter resiliência e persistir no empreendimento, independente de nacionalidade,  Kinan afirma que tem lugar para todos no Brasil. “Tem espaço pra todo mundo, tem terra pra todo mundo e chuva também. Tem espaço para quem trabalhar bem e oferece um bom produto. É difícil, mas o povo brasileiro gosta de novidade, de coisa diferente. O importante é não desistir”. Nas entrelinhas da sua fala, Kinan finaliza: Vamos queridos!



 

 

 

 

 

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