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Casa das Sementes resgata a cultura da semente tradicional e fomenta a agricultura familiar

Projetos

No Ceará, Cáritas Brasileira, Fundação Banco do Brasil e União Europeia apoiam projetos que fomentam segurança alimentar

Publicação: 05/02/2020




Na Diocese de Tianguá (CE), a Cáritas Brasileira e Diocesana, a Fundação Banco do Brasil e a União Europeia contribuem para o fomento de 30 Casas das Sementes, sendo que oito foram construídas e 22 fortalecidas com a compra de equipamentos. O objetivo principal das casas comunitárias de sementes é promover o resgate e a tradição milenar de cultivar, produzir e armazenar sementes crioulas, garantindo a autonomia e a soberania alimentar das famílias.


Por Olga Oliveira – Especial para a Cáritas Brasileira

Fotos: Virginia Maria Yunes – Especial para a Cáritas Brasileira 


A partir da existência da Casa das Sementes, foi criada em 2015 a Rede de Intercâmbio de Sementes (RIS) da Região do Ibiopaba (CE), para fortalecer a agricultura camponesa a partir da autonomia, preservação e conservação de sementes crioulas com produção agroecológica. Fazem parte da RIS 30 comunidades de sete municípios cearenses. 


A coordenadora da Cáritas Diocesana de Tianguá, Lourdes Camilo, 52 anos, conta sobre o início do trabalho com as casas de sementes. Segundo ela, o trabalho com as sementes crioulas nasceu em 2013 quando a Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA) trabalhou um projeto que tratava de fortalecer o cultivo de sementes crioulas na região. “Um trabalho que já existia, cada família que está na zona rural já produz alimento e tem o costume de guardar as sementes crioulas para plantio. Isso já vem de uma tradição antiga: o produzir, selecionar e guardar as melhores sementes para o próximo plantio. Mas não era um trabalho realizado de forma organizada. Cada família fazia, guardava individualmente e esse trabalho da Casa das Sementes chegou para ajudar a organizar de forma coletiva”, conta Lourdes. 

Com o apoio e fomento financeiro da Cáritas Brasileira, Fundação Banco do Brasil e União Europeia, por meio do Projeto de Fortalecimentos da Economia Solidária no Brasil foram apoiadas diretamente seis Casas das Sementes e também, parte dos recursos foram aplicados para elaborar materiais didáticos bem como para a articulação e fortalecimento da RIS que é composta por 30 Casas das Sementes na região.


Depois de conversamos com a coordenadora da Cáritas da Diocese de Tianguá, fomos visitar a Comunidade do Sitio do Meio do Top, no munícipio de São Benedito (CE). 

Leia Maria de Jesus Lima, 47 anos, quatro filhos (foto acima). “Nós começamos a Casa das Sementes no município de São Benedito, Sitio do Meio do Top, com o apoio da Cáritas da Diocesana e da RIS que nos incentivou a criação. Então começamos com poucos sócios. Iniciamos com 40 sócios. Com o tempo pessoal foi se interessando mais por guardar nossa semente crioula. O incentivo da nossa casa é resgatar aquela semente dos nossos pais, nossos avós guardavam, preservavam para que quando fosse no inverno todos tivessem a semente para plantar. Agora com a implantação das casas de semente estas sementes estão voltando, pois elas estavam sumindo. As variedades de semente eram poucas. Foi aí que surgiu esta ideia de resgatar e cuidar destas sementes então nós somos as guardiãs das sementes”, expressa Leia. 

  Leia conta que estão organizando Casa das Sementes para que cresça e tenha mais estoque, pois em 2019 o inverno foi muito pesado na região e não conseguiram boa colheita. “Chamamos aqui de seca verde, chove muito, dá o fruto, mas não conseguimos colher porque ele apodrece. Estamos lutando com a pouca variedade que temos”, explica Leia.

Maria das Graças Rodrigues Ferreira, 41 anos, casada, três filhos, é associada da Casa das Sementes desde a sua implantação em 2017. Ela recebe sementes do feijão de moita, preto, carioca e outras espécies de feijão e sementes de milho. “Nós pegamos dois litros [garrafas pets] e devolvemos quatro, quando a colheita não é muito produtiva, mas quando ela é boa, sempre devolvemos mais”, conta. Maria afirma que a semente é de qualidade, “no caso feijão, um feijão limpo, não tem nada de impurezas, é um feijão que nasce muito bom”, revela. Segue contando, “na época da colheita, nós vendemos o feijão maduro, nas feiras agroecológicas. Também plantamos macaxeira, cana de açúcar, vários tipos de feijão. Ainda plantamos os canteiros que tem a plantação da cebola, alface, couve, cheiro verde, pimentinha, cebola de cabeça. Mas o cultivo é pequeno por falta da água, mas esses produtos não precisamos comprar e é natural”, diz. 


Marivana Rodrigues Souza, 49 anos, quatro filhos, relata que é muito feliz em poder participar deste empreendimento. Conta que antes da Casa das Sementes precisava comprar sementes para plantar e, ao tornar-se sócia, no período do plantio, busca a semente no mês de janeiro e em dezembro devolve. Ela ressalta que com os papéis de associada da Casa das Sementes consegue comprovar junto aos órgãos públicos que é agricultora e assim consegue os benefícios, como por exemplo, a aposentadoria. Contou ainda que foi com o trabalho na agricultura que sustentou os filhos, pois o marido foi embora para o Rio de Janeiro e a deixou. Hoje os filhos seguem com ela no pequeno sítio em que mora. Além do feijão e milho, cultivam laranja, abacate, tangerina e banana.  Conclui dizendo: “Tem todo tipo de fruta lá. Criamos galinha, porco, a gente se vira na lida da vida. A Casa das Sementes além de me dar sementes muito boas, me ajuda como pessoa, me faz crescer com as formações e ajuda muito no sustento saudável da minha família. Sou muito grata pela oportunidade de participar como associada”, enfatiza.

Francisca das Chagas Soares, 43 anos, sete filhos, dois netos é vice-coordenadora da Casa da Sementes. Francisca diz que o projeto em parceria com a Cáritas Brasileira, Fundação Banco do Brasil e União Europeia foi fundamental para a criação e fomento da casa. Ela diz: “Nós tínhamos um dinheiro guardado, das coisas que fazíamos na associação, mas não sabíamos como ir para frente, então, com esse projeto foi um ‘empurrão’ para levar em frente a Casa da Semente.” Ela nos diz ainda que para as famílias da comunidade a casa tem sido um grande diferencial, estão reconhecendo, por exemplo, “a importância dos produtos orgânicos que antes não acreditavam, só tinham fé no veneno, então mudou a mentalidade de um grande número de pessoas”. 


Marineide Isaias Souza, 49 anos, 4 filhos, é coordenadora da Casa da Semente do munícipio de São Benedito (CE), no Carnaúba II. Marineide conheceu a Casa da Semente em 2015 e, logo começou a participar das reuniões e formações para levar a proposta para sua comunidade. “Meus antepassados, meus avós tinham o costume de guardar as sementes em potes, em latas de querosene ou num paiol. Quando a chuva chegava nós tínhamos a semente. Com o tempo estas práticas de armazenamento acabaram e dependíamos do governo. Então, com a chegada da Casa da Semente, tudo melhorou e voltamos a ter as sementes de qualidade. Com isso, também veio a diversificação do plantio, porque nós só tínhamos o costume de plantar o feijão carioca, feijão sempre verde e o milho e hoje nós temos uma variedade de sementes. Estamos resgatando o feijão  borboto, o milho dente de cavalo, milho dente chato, a fava branca, a fava pombinha, a fava pintada e muitas outras variedades. Hoje estamos já estamos com 11 espécies diferentes”. Ao falar do apoio Cáritas Brasileira, Fundação Banco do Brasil e União Europeia, Marineide diz que além de ter sido essencial para fortalecer os trabalhos do grupo, o investimento foi revertido, também, em formação para os associados. 


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