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Cáritas promove encontro nacional para debater desafios e avanços na área de migração e refúgio

Áreas de Atuação

A atividade aconteceu entre 19 e 22 de fevereiro, em São Paulo-SP, com a participação de agentes Cáritas de todas as regiões brasileiras.

Publicação: 24/02/2025



Entre os dias 19 e 22 de fevereiro de 2025, a Cáritas Brasileira realizou o Encontro da Comissão Nacional de Migração (Conmir), reunindo agentes, especialistas da área e representantes de organizações parceiras para discutir os desafios e avanços no acolhimento e integração de pessoas migrantes e refugiadas no Brasil. 


“O evento tem como foco a atualização da análise sobre a realidade migratória na América Latina, a revisão do histórico de atuação da rede Cáritas, conhecer a dinâmica de trabalho no estado de São Paulo e o planejamento de ações futuras”, explica Cristina dos Anjos, assessora nacional da Cáritas Brasileira e referência na área de atuação em Migração e Refúgio. “Representa também uma oportunidade de intercâmbio de vivências entre agentes Cáritas das diversas regiões do país”, acrescenta.


Neste encontro, estiveram representados os estados do Acre, Pará, Piauí, Pernambuco, Distrito Federal, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina, além de São Paulo, com a presença e participação de agentes das Cáritas Diocesanas de Bauru, Mogi das Cruzes, Guarulhos, além da Cáritas Arquidiocesana de São Paulo e Cáritas Regional São Paulo.


A programação incluiu painéis sobre a realidade migratória, visitas a espaços de acolhimento institucional de pessoas migrantes e refugiadas, assim como debates sobre a incidência política. Além disso, houve momentos de espiritualidade e avaliação coletiva, encerrando-se com uma visita ao Museu da Imigração do Estado de São Paulo.


Conhecendo a dinâmica de trabalho na capital paulista



Durante o Encontro Nacional da Conmir, as pessoas participantes tiveram a oportunidade de conhecer de perto a atuação da Cáritas Regional São Paulo no acolhimento de pessoas migrantes e refugiadas. Como parte da programação, foram realizadas visitas a diferentes espaços de acolhimento na capital paulista, promovendo a troca de experiências e reflexões sobre desafios e boas práticas.


Um dos locais visitados foi a República da Cáritas Regional São Paulo, administrada em parceria com o Governo do Estado. O espaço acolhe migrantes por até três meses, após um período inicial de estadia na Casa de Passagem Terra Nova 1, outro equipamento gerido pela Cáritas, em parceria com o poder público e organizações humanitárias. 


Localizada na zona leste da cidade, a república da Cáritas Regional São Paulo tem capacidade para receber até 80 pessoas e, atualmente, abriga 30 migrantes de diferentes nacionalidades, incluindo libaneses, afegãos, russos, peruanos, venezuelanos e somalis.


“As pessoas que chegam ao nosso serviço de acolhimento são, em sua maioria, afegãos, mas também atendemos venezuelanos, somalis e outras nacionalidades”, explica Diego Cleiton Anacleto, coordenador do serviço de acolhimento institucional na modalidade república da Cáritas Brasileira Regional São Paulo. “Elas chegam até nós por meio da Casa de Passagem e, a partir daí, trabalhamos para garantir que tenham autonomia e consigam reconstruir suas vidas, seja em São Paulo ou em outras regiões do Brasil”, finaliza.


Além de oferecer moradia temporária, o serviço de república assegura o acesso a direitos básicos fundamentais. “Nós garantimos assistência em diversas áreas essenciais, como saúde, educação, lazer e empregabilidade, para que essas pessoas possam, de fato, se integrar e seguir adiante ao lado de suas famílias ou daqueles com quem compartilham essa jornada”, acrescenta Diego.


A equipe da república conta com trabalhadoras migrantes, como Mansura Rafiay, do Afeganistão, que chegou ao Brasil há dois anos e hoje atua como orientadora social na Cáritas Regional São Paulo. “Fui acolhida pela Cáritas e, para mim, foi uma experiência muito boa. Eles me acompanharam de perto e me ajudaram a recomeçar minha vida aqui. Depois de um tempo no abrigo, consegui essa oportunidade de trabalho dentro da própria instituição, e isso foi muito importante para mim, que hoje posso alugar uma moradia”, relata.


Apesar dos avanços, Mansura ainda enfrenta desafios, como a distância da família. “Não posso voltar para o meu país porque é muito perigoso para mim. Minha família ainda está lá, e meu maior desejo agora é trazê-los para cá. Estou tentando fazer a reunião familiar”, compartilha, evidenciando a realidade de muitos refugiados que aguardam pelo reencontro com seus entes queridos.


A programação também incluiu uma visita à Cáritas Arquidiocesana de São Paulo, onde os participantes foram recepcionados com um almoço preparado por uma migrante afegã já assistida pela instituição, reforçando a importância da cultura e da integração no processo de acolhimento. Além disso, houve uma visita à Missão Paz, onde ocorreram diálogos com parceiros da Rede Clamor e pastorais, fortalecendo articulações para a promoção de políticas de acolhimento e inclusão.



O impacto do contexto político na migração


Na abertura do evento, Paulo Illes, coordenador de relações institucionais do Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante (CDHIC), abordou a conjuntura global de ondas anti migratórias, destacando o crescimento dessas narrativas em países como Portugal e nos Estados Unidos. "Uma forma eficaz de combate à xenofobia é a disseminação de informação de qualidade e o fortalecimento das políticas de acolhimento e concessão de refúgio", afirma.


Ainda nesse contexto, Illes ressaltou a necessidade de mobilização para a construção de uma política migratória nacional, que supere a perspectiva emergencial e estabeleça um modelo de governança migratória duradouro. "Precisamos discutir com a sociedade brasileira um novo modelo de gestão migratória", completa.



Realidades regionais e desafios locais


Durante as discussões regionais, representantes de diferentes partes do Brasil compartilharam desafios e iniciativas locais relacionadas à migração. No Sul, foi destacada a questão da violência de gênero e da empregabilidade. No Nordeste, o fomento ao empreendedorismo solidário e a educação infantil interétnica foram temas centrais. No Norte, as preocupações envolveram as fronteiras e o acolhimento de indígenas Warao, enquanto no Centro-Oeste foram abordadas questões de saúde mental e integração de migrantes interiorizados.


A atuação de São Paulo também foi enfatizada como referência na histórica formação migrante da capital, especialmente no acolhimento institucional em formato de república, enfrentando desafios no âmbito da incidência política, a saúde mental das pessoas migrantes e o combate ao tráfico de pessoas. Já em Minas Gerais, a discussão girou em torno da empregabilidade dos indígenas Warao e da necessidade de reavaliar o conceito de trabalho dentro desse contexto.


Reflexão sobre fronteiras e integração


O Padre Alfredinho, da Missão Paz e Serviço Pastoral dos Migrantes (SPM), trouxe uma reflexão sobre as diferentes fronteiras que os migrantes enfrentam: territorial, político-jurídica, cultural e étnico-religiosa. Ele destacou que, apesar de muitos migrantes conseguirem ultrapassar a barreira geográfica, a integração social é dificultada pela fronteira político-jurídica, marcada por legislações restritivas e burocracias. "Trabalhar com migrantes é romper fronteiras", afirma, reforçando que a segregação em guetos é um dos grandes desafios para a inclusão plena.


Experiências e estratégias para o futuro



No terceiro dia, os participantes refletiram sobre os aprendizados adquiridos durante as visitas aos abrigos e espaços de acolhimento em São Paulo, além de debaterem avanços e desafios da atuação da Cáritas. 


Foi destacada a importância da colaboração entre instituições que atuam com migração e refúgio, enfatizando a necessidade de um trabalho conjunto, baseado na troca de informações, experiências e boas práticas. Essa interconexão é fundamental para fortalecer a rede de apoio e proporcionar um atendimento mais qualificado e humanizado às pessoas em situação de mobilidade. Além disso, a urgência de dar visibilidade à situação emergencial de certos territórios foi ressaltada, destacando a necessidade de adaptar as ações à realidade de cada local.


Também foi abordada a necessidade de desenvolver estratégias políticas que ajudem a prevenir deslocamentos forçados e crises humanitárias, com foco em trabalhar as causas estruturais desses deslocamentos. A importância de antecipar-se às emergências foi destacada, com o objetivo de mitigar o sofrimento humano e tornar as respostas mais eficazes e duradouras. Foi ressaltada, ainda, a relevância de manter os valores centrais que caracterizam a atuação das organizações, como a acolhida humanizada, a defesa dos direitos e a promoção da autonomia das pessoas atendidas, mesmo com as adaptações necessárias às diferentes realidades regionais.


Por fim, Padre Marcelo Maróstica, vice-presidente da Cáritas Arquidiocesana de São Paulo, lembrou que, apesar dos avanços e das experiências consolidadas na rede Cáritas, a atuação na temática migratória ainda está em construção. Ele propôs uma reflexão coletiva sobre os rumos dessa atuação, incentivando os participantes a pensarem no futuro da Cáritas no campo da migração e do refúgio. “Estamos construindo esse caminho juntos, e é essencial refletirmos sobre a abordagem que queremos consolidar para fortalecer nosso compromisso com aqueles que buscam recomeçar suas vidas no Brasil”, conclui.



Perspectivas para o futuro


O encontro culminou com o planejamento anual da Conmir e a reflexão sobre a atuação da Cáritas na área de migração. Entre as propostas destacadas, estão o fortalecimento da rede de atendimento, a integração dos serviços e a ampliação do debate sobre um novo modelo de gestão migratória para o Brasil.


O evento reafirmou o compromisso da Cáritas Brasileira em seguir promovendo acolhimento digno e inclusão social para pessoas migrantes e refugiadas, consolidando a atuação da instituição como referência no campo humanitário.


A atividade é uma iniciativa do Projeto de Integração para Incidência, realizado pela Cáritas Brasileira e financiado pela Cáritas Alemanha. 


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