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Mulheres migrantes sofrem o impacto da falta de acesso à água para necessidades básicas

Projetos

Campanha Água e Mulheres marca o mês de março e chama atenção para realidades de escassez

Publicação: 19/03/2020




Texto: Jucelene Rocha - Comunicação Cáritas Brasileira

Fotos: Platô Filmes


Apesar de quase 70% do território mundial ser coberto por água, menos de 1% é potável e precisa ser administrada para abastecer quase 7 bilhões de pessoas, além de garantir igualmente a vida animal e a biodiversidade, por meio do abastecimento necessário para a conservação das florestas e de todos os ecossistemas.

Resoluções das Nações Unidas reconhecem que a água e o saneamento básico  são direitos fundamentais. Não há vida sem água, por isso, esse recurso é um bem comum que deve ser compartilhado entre toda a humanidade e os demais seres vivos. O acesso à água é direito humano, é direito da natureza.

Levando em consideração a sustentabilidade dos ecossistemas, o sistema econômico global é extremamente devastador. Os impactos da ação humana motivada pelo sistema econômico predatório são sentidos em todas as partes do planeta produzindo impactos socioambientais gravíssimas como alterações climáticas, pobreza extrema, poluição e destruição dos ecossistemas essenciais para a renovação da água.

Água e minorias - A questão socioambiental atinge de maneira mais violenta as minorias sociais e as populações mais vulneráveis. Neste grupo estão as mulheres migrantes.

A crise humanitária na Venezuela, que gera desde 2016 o aumento do fluxo migratório na fronteira entre o país e o Brasil, tem revelado o desafio de garantir o acesso à água para todas as pessoas que vivem em situação de migração. Em atenção a essa realidade, a Cáritas Brasileira elegeu o tema Água e Mulheres para sua ação de mobilização nas redes sociais em decorrência do Dia Mundial da Água, 22 de março. 

A cubana Kirenia Sanchez Batista, relata sua percepção sobre a necessidade humana de acesso à água: “Para mim água é tudo, primeiro porque sou mulher, segundo porque sou mãe e terceiro porque nós humanos precisamos de água para viver. Para nós a situação da água está difícil e não só para nós que estamos na rua. É eminente que vamos ficar sem água”, constata a migrante que vive em Boa Vista (RR). 



Kirenia Sanchez Batista, migrante cubana que vive em Boa Vista (RR), experimenta as dificuldades do acesso a água.


A desigualdade de gênero se aguça como impacto da falta de acesso à água. A escassez e má distribuição levam mulheres a percorrerem longas distâncias ou enfrentarem situações adversas para obter água para beber, cozinhar e garantir minimamente a higiene da família. Antônia Edileuza viveu essa realidade. A escassez de água a acompanhou durante grande parte da infância. Ela nasceu no sertão nordestino, historicamente uma região que costuma enfrentar grandes períodos de seca. “Fomos criados com essa dificuldade de não ter água, a gente buscava água muito longe, não era todo dia que a gente tomava banho, nem sempre lavava roupa, a gente não tinha esse contato muito com a água. Lá no Nordeste o poço mais próximo da nossa casa tinha mais de 150 metros de profundidade, mas a água ninguém suportava tomar, era muito salgada. Não tinha nem como cozinhar com a água, então era praticamente inutilizada. Eu hoje dou muito valor para a água e sempre oriento minhas filhas que a água nós temos em pouca quantidade, a gente pensa que é muita  porque a gente abre a torneira e sai, o fato de ter água na torneira não é motivo para desperdiçar”, orienta a mãe de origem nordestina. 

A haitiana Mary Eugênia Etienne, vive atualmente no Brasil e também já passou por momentos de escassez. “Quando a gente chegou aqui queria tomar banho o dia inteiro e a mãe lembrava, ‘minha filha aqui pagamos a conta da água’. Minha mãe sempre nos orientou a não gastar muita água, sabemos que a água tem um ciclo e temos que cuidar, a mãe nos disciplinou desse jeito e sabemos que se pagamos a conta temos água e se não pagamos a empresa corta a água”, relata Mary Etienne que se revelou ter ficado chocada ao chegar ao Brasil e descobrir que teriam que pagar para ter acesso à água potável.



A haitiana Mary Eugênia Etienne aprendeu  com a mãe a valorizar cada gota de água


As histórias dessas mulheres são apenas um reflexo da realidade de milhares de refugiadas, migrantes e brasileiras em situação de rua ou que vivem em ocupações de prédios públicos.

De acordo com dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), globalmente, mulheres e meninas gastam 200 milhões de horas coletando água todos os dias para suprir necessidades básicas e manter minimamente o cultivo de alimentos e a criação de animais para consumo próprio. Conforme dados da ONU, 70% das pessoas que vivem em situação de pobreza no mundo são mulheres, em especial  negras, latinas, indígenas e migrantes. 

Em 2018 o Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA) criou um ambiente de reflexão que levou conscientização a respeito de como convivemos com uma gestão injusta da Água. “É preciso construir uma nova cultura da água, sustentada em valores éticos, ecológicos e culturais que garantam a inclusão e a justiça socioambiental, prezando pela transparência e participação popular ampla e representativa dos diferentes setores da sociedade”, diz um dos textos mobilizadores do FAMA.

Segundo a ONU, cerca de 663 milhões de pessoas no mundo não têm acesso a fontes adequadas de água. O UNICEF alerta que mais de 800 crianças, com menos de cinco anos, morrem todos os dias de diarreia associada à falta de água e de higiene. 

Água é direito - A campanha Água e Mulher é uma inciativa de solidariedade com as mulheres migrantes que vivem os problemas gerados pela ineficiência da gestão da água no mundo. Com o slogan “Água: para quem precisa, cada gota faz falta”, a campanha nas redes sociais teve início no Dia Internacional da Mulher, 08 de março, e segue até o Dia Mundial da Água, 22 de março,  com postagens que apresentam a realidade de várias mulheres migrantes diante do desafio sobreviver em meio à escassez de água. “No Dia Mundial da Água, faça sua parte: reflita sobre como você utiliza esse bem essencial para a vida”, este é o convite da campanha. Acompanhe as ações dessa iniciativa nas redes sociais da Cáritas Brasileira.


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